quarta-feira, 19 de março de 2014

Felicidade circunstancial

Você é feliz?
Quase a totalidade das pessoas respondem afirmativamente quando esta pergunta é feita diretamente.
Claro, existe um espaço entre a  pergunta e a resposta que pode durar poucos segundos até mesmo alguns minutos.
E o que acontece neste espaço de tempo que o arguído demora a responder?
Atrevo-me a dizer que durante este tempo, a pessoa para qual a pergunta foi feita estabelece uma balança em suas memórias e vai colocando em cada lado suas perdas e suas realizações, esperando que no fim a matemática encarregue-se de pender a balança mais para o lado das realizações.
O estado de espírito da pessoa naquele momento também conta para a composição da resposta mas basicamente a maneira como as pessoas analizam a vida a fim de dizerem se são felizes ou não é muito parecida.
Como as pessoas são todas favoráveis às suas próprias felicidades, cada realização é supervalorizada e cada perda é tratada com um conformismo sem fim. Atribuímos culta às circunstâncias, àquela frase comum "não era para ser meu", aquela outra frase mais comum ainda "Deus sabe o que faz", "coisas melhores vêm para mim" e até mesmo descontamos importância ao que queríamos e não conseguimos.
Enfim, realizamos um certo esforço, ajeitamos as arestas aqui e alí para no fim, com um sorriso amarelo no canto da boca, admitirmos que sim, somos felizes sim. Pouquíssimas pessoas assumem a infelicidade.
Mas e esta felicidade que admitimos? esta felicidade que propagamos? Como podemos caracterizá-la? Será que podemos simplesmente chamar de felicidade a diferença positiva entre o que deu certo do que deu errado? Seria a nossa felicidade uma felicidade circunstancial? Será que somos felizes apenas por imaginarmos que poderíamos estar pior?
Vivemos competindo por felicidade? Temos mesmo a necessidade de parecermos mais felizes perante as pessoas que conosco convivem? Será que as circunstâncias valem mais para medir a felicidade do que as realizações? Será que sabemos realmente o que são as realizações e o que são as ilusões do dia a dia?
Vejo várias pessoas presas em um presente circunstancialmente feliz justamente pelo fato de em um passado tudo ter se perdido, tudo era dor, tudo era sofrimento. vejo pessoas que não escalam a felicidade e nem sequer esboçam uma reação perante a estagnação do caminhar.
Pessoas param em fases da vida, deixam de caminhar para observar a estrada se movendo junto com o tempo, cada vez mais veloz, cada vez mais implacável.
E a lua não é mais observada, e os bons dias são ditos com cada vez menos frequência, cada vez com a voz mais automática, cada vez com menos sorriso nos lábios. E as flores, as árvores, os animais, as crianças, as paisagens são coisas que ficam só na lembrança, cada vez mais no fundo do baú.
Pessoas se fecham dentro de casa, dentro de bares, igrejas, escritórios, dentro de sí mesmas e com medo de o passado voltar, colam uma etiqueta na testa: Minha vida é perfeita e feliz!
A felicidade circunstancial!



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