sábado, 30 de março de 2013

Paquiderme

Sempre passei por um problema recorrente em minha vida. Este problema era cíclico, ia e vinha em determinados momentos, em determinadas situações e épocas. Eu praticamente não podia baixar a guarda, eu praticamente não conseguia me sentir seguro e relaxado. Era como um câncer que vinha, se instalava e a cada sessão de quimioterapia ele desaparecia para voltar mais forte depois. Era uma luta que não tinha fim e que nos momentos em que a doença parecia estar sob controle, eu sorvia de uma felicidade ilusória, efêmera.
Então era assim que eu vivia, ora sob os efeitos da doença, como em carne viva, exposto à dor intensa, aguda, ora sob efeito da quimioterapia que me fazia esquecer a dor e almejar uma nova vida. Uma vida correta, como deveria ser.
Resolví mudar tudo. A doença não tinha cura e a quimioterapia estava só protelando o inevitável. Resolví tentar outra tática, outra coisa para não ficar mais em carne viva e nem anestesiado esperando a próxima crise. Resolví deixar de ser como aqueles animais de pele fina, sem pelos e sem escamas (os anfíbios) e me posicionei pronto para ser como os paquidermes. animais de pele espessa, elefantes, hipopótamos e rinocerontes.
Resolví não esconder minha doença, resolvi encarar meus problemas de forma aberta e clara com todos que me rodeiam e isto, esta tática, esta estratégia, este modo de ver as coisas foi justamente o que me fez criar esta pele grossa. A cada vez que me expunha, a cada vez que falava ia criando uma crosta, uma carcaça cada vez mais pesada, cada vez mais espessa, impenetrável.
Hoje convivo com meus problemas, internos, passados no tempo, contemporâneos na memória porém sem aquela sensação de nervo exposto, sem aquela sensação de carne viva, de dor aguda e constante.
Hoje sou um paquiderme, em que a doença existe, dói e ninguém vê.

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